Maurice Dorléac, ator e propagandista pró-nazi durante a ocupação da França, é pintada como uma pessoa insaciável quando se trata de ganhar dinheiro e infiel nos amores. Condenado depois da guerra, em Janeiro de 1945, pelo Tribunal Civil de Paris por colaboracionismo, o pai de Catherine ficou com uma grave mancha no currículo. Violet acusa a atriz de ter feito tudo para ocultar o passado “negro” do pai, “premiado” com a pena de “indignidade nacional”. O tribunal criado pelos ex-resistentes ao nazismo deu como provado que Maurice Dorléac participou em mais de 70 programas da Rádio Paris — que se especializou desde o Verão de 1940 na defesa da “Nova Europa” de Hitler e nos ataques aos ingleses, ao general de Gaulle, aos judeus e à franco-maçonaria. Dorléac foi igualmente ator em dois filmes de propaganda nazi, um deles glorificando a “Milícia francesa”, cujo principal objetivo era desmantelar a resistência e denunciar a “lepra judaica”.
Durante a investigação para a elaboração do livro, Violet não conseguiu falar com Catherine Deneuve nem sobre passado do pai nem sobre qualquer aspecto da sua vida pessoal ou profissional. E também encontrou todas as portas bem trancadas quando tentou recolher informações junto dos familiares e amigos mais próximos.
A estrela do cinema, vista na França como o símbolo da beleza absoluta, da classe, da sofisticação e do “glamour” da mulher parisiense, manteve-se fiel à sua já lendária distância em relação aos jornalistas. Deneuve é uma “star” e, como tal, cultiva a aura de mistério que desde cedo a envolveu. No entanto, Violet acusa-a de ser vingativa, de apenas dar entrevistas a jornalistas amigos e de impetrar ações em tribunal — com pedidos de indenização — contra todos os que escrevem sobre ela revelando aspectos não autorizados da sua vida.
Mas, graças à consulta de arquivos e depoimentos de ex-sócios ou ex-colaboradores da atriz, a biografia revela alguns aspectos surpreendentes da sua personalidade. Descreve-a como uma mulher de negócios ávida por dinheiro que, por exemplo, tem o hábito de cobrar elevadas quantias — em dinheiro vivo, mas pagas através de discretos “envelopes” — para honrar com a sua presença acontecimentos, festas mundanas e, até, para comparecer em alguns programas de televisão.
No campo amoroso, o jornalista aborda as diversas relações conhecidas de Catherine — do cineasta Roger Vadim ao ator Marcello Masttroiani, pais dos seus dois filhos, Christian Vadim e Chiara Mastroianni. Catherine só se casou uma vez, com o fotógrafo David Bailey, e a união durou apenas dois anos. Mas o livro evoca outras ligações amorosas, mais polêmicas e escandalosas, sempre desmentidas pela atriz, como com o autor-cantor Serge Gainsbourg e o dono de um canal francês de televisão, Pierre Lescure. Violet realça alegadas infidelidades de Deneuve e não deverá escapar, por isso, a um processo em tribunal.
Nos últimos anos, o escritor demoliu diversos mitos franceses como o comandante Jacques Cousteau e, agora, conclui o ciclo dos três “Dês” do cinema francês — Alain Delon, Gerard Depardieu e Catherine Deneuve. Em Catherine l’Affranchie, o jornalista avança por terrenos muito delicados e pouco habituais no jornalismo francês, dando por exemplo a entender que Catherine manteve também ligações amorosas com o ator Gerard Depardieu e com o cantor de rock Johnny Hallyday. No capítulo sobre Depardieu, Violet insinua ainda outras “revelações”, citando declarações de Deneuve como, por exemplo, “a maioria dos atores franceses são homossexuais… estive apaixonada por homens bissexuais… mas as atrizes devem desconfiar quando se apaixonam por um bissexual”.
A grande atriz de filmes “cults” como Belle de Jour ou Le Dernier Métro, que trabalhou sob a direção de cineastas como Polanski, Buñuel, Téchiné ou Truffaut (este também um alegado amante), sai deste livro com um retrato pouco lisonjeiro, mas algo confuso. O ex-repórter de televisão agora autor, com a rep
utação de “justiceiro franco-atirador”, não esconde a sua admiração pela inegável lenda viva que, ninguém duvida, é Catherine Deneuve, e entrou em áreas delicadas da sua vida por vezes com fontes demasiado frágeis. Violet garante que a “sua” Deneuve é “bem mais apaixonante” do que a imagem de “santa” que tem prevalecido até agora.