Pelos corredores do Copacabana Palace passaram reis e rainhas, a fina flor de Hollywood, as grandes vozes da canção do século XX. Até eu fiquei por lá uma temporada com direito a boas conversas à beira da piscina com a atriz e escritora Maitê Proença com direito a esticadas no recém-inaugurado Gero Carioca em companhias dos queridos amigos Anatalia e William Riley. Branca. Imponente. Imune à sombra.
A fachada do Hotel Copacabana Palace faz frente à praia musa da Bossa Nova. Na entrada do edifício 1702 da Avenida Atlântida, projetado pelo arquiteto francês Joseph Gire, há uma fila de automóveis da série milionária onde, num forno tropical, saem cavalheiros engravatados e senhoras que se equilibram em sapatos com saltos do cume da Torre Eiffel.
É regra. Antes de entrar no luxo passa-se a fronteira. Três seguranças — criaturas abençoadas pela largura dos dorsos — miram alto a baixo, direita e esquerda. O capitão-porteiro não faz caratê. Usa luvas. Só as despiu para saudar a princesa Diana. Jorge Freitas, o funcionário mais antigo da unidade hoteleira inaugurada a 13 de Agosto de 1923, dispõe de quatro décadas no ponto crucial: a porta. Viu. Ai se viu! Bill Clinton tomando sorvete. O riso compulsivo de Nicolas Sarkozy. O rigor de Bono Vox perante as fãs. A “bituca” a derreter nos dedos de Mick Jagger. A descontração de Mário Soares.
Rod Stewart, paciência, não voltará a pôr os calcanhares neste éden carioca. Certa noite quis transformar a sua suíte no Maracanã. Chamado pelos incomodados para interferir no “baba” do pop star, o então gerente Klaus Flunkert, um alemão carismático e considerado no ramo da hotelaria como um dos melhores profissionais do planeta, seduzido pelo bom humor e a paixão de Stuart pela bola, antes de terminar a farra teria feito varias tabelinha com o cantor, naturalmente preservando o mobiliário quase secular.
Já em 1942, Orson Welles, após litros de whisky sem gelo, tivera similar fúria com a ‘nega’ que levara de Dolores Del Rio. Poltrona, dois candelabros e uma mesa acabaram afogados na piscina.
A porta giratória de freijó e vidros curvos dão o aval. E eis o palácio. Os sentidos dão de caras com o aroma capim-limão. Toalhas quentes embebidas sossegam a umidade das mãos. Água no bule de prata mata a sede com classe.
O Golden Room, aquele que foi o maior palco de espetáculos do Brasil, passou a espaço cultural. Esse piso de vidro recebeu laringes de céu. Maurice Chevalier, Ella Fitzgerald, Yves Montand, Edith Piaff.
Amália Rodrigues, Tom Jobim e Marlene Dietrich que deixou memória não só pelo talento. A diva alemã, no seu show memorável em 1959, surpreendeu um funcionário ao pedir um balde de champanhe cheio de areia… Os banheiros ficavam longe. E o seu vestido colante impedia-lhe de descer os vinte degraus.
Os tempos mudaram menos a vontade de perdurar o primor de dez mil metros quadrados. Assim, em 1989, o Grupo Orient Express, adquiriu por 23 milhões de dólares o imóvel construído em 1923 pela família Guinle e adaptou sem descaracterizar a grandiosa estrutura criada pelo arquiteto Cesar Mello e Cunha. As obras de reestruturação foram muitas e continuam, No entanto, ninguém ousa tocar no piso de mármore de Carrara, nos cristais da Boemia.
Dois restaurantes novos, porém com alma antiga. Quadra de tênis, SPA, piscina paraolímpica. No prédio principal, foram remodelados cerca de 150 apartamentos e suítes. No anexo, 76 suítes foram s refeitas. Aliás, bendito anexo onde tantos encontros furtivos aconteceram. Tantos, que uma passagem secreta ligava o salão de cabeleireiros às suítes. Ali enfartos já levaram amantes ao cemitério, ali também a princesa Diana foi flagrada por paparazzis em trajes nada convencionais para uma princesa.
Nos idos de 1931, o tio da sua sogra, príncipe de Gales Edward, nobre não muito chegado a banhos, chorou as mágoas por ser rejeitado pela uruguaia Negra Bernardez… talvez até pela falta de um bom banho.
Discreto apesar dos bigodes e daquela foto da língua, quem também pousou lá, foi o físico Albert Einstein. Ele não quis assinar o livro de hospedes! Mas o Copacabana continua lá. Impávido colosso com milhares de histórias contadas e a contar.
Celso Mathias